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Colégio é condenado a indenizar ex-aluno que sofreu bullying
Instituição de ensino deverá indenizar estudante em R$ 10 mil por danos morais. O Colégio Cavalieri, localizado na capital mineira, foi condenado a pagar a um ex-aluno indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil pelo fato de o estudante ter sido vítima de bullying dentro da instituição de ensino e, também, ter sido vítima de mensagem difamatória, publicada por hacker no site da escola.
A decisão é da 15ª. Câmara Cível do Tribunal de Minas Gerais (TJMG), que reformou sentença proferida pela comarca de Belo Horizonte. Em setembro de 2009, o estudante P.L.C. encontrou, no site da escola, em página de acesso restrito ao aluno, texto de advertência onde constavam várias informações vexatórias e difamadoras contra ele. Na companhia da mãe, P. procurou o colégio para denunciar o fato. Contudo, segundo ele, não foi bem-recebido pelos responsáveis pela escola, que não lhe deram nenhuma explicação sobre o fato e não se desculparam pelo ocorrido, apenas determinando a retirada do comentário do site.
Sentindo-se humilhado e constrangido com o texto, P. decidiu entrar na Justiça contra o colégio, pedindo indenização por danos morais. Alegou que sempre foi vítima de atos vexatórios e de agressões por parte de um colega de sala. P. afirma que por várias vezes procurou a coordenação da instituição, que não tomou nenhuma atitude para frear ou punir o agressor, sugerindo a P., apenas, que ignorasse o infrator. Contudo, o bullying não parou.
O estudante alegou que toda a situação, culminada com o texto difamatório publicado no site da escola, provocou nele abalos psicológicos e que ele só teria continuado indo à escola por obediência aos pais. P. argumentou também que o colégio se omitiu diante do que vinha ocorrendo e não tomou as devidas providências para impedir que outras pessoas, além de coordenador da instituição, tivessem acesso à área restrita do aluno no site. Pediu, assim, a condenação do colégio por prática de bullying, já que as agressões ocorreram dentro da instituição.
Em sua defesa, o Colégio Cavalieri afirmou que apenas o coordenador do colégio tinha a senha de acesso restrito e que o site tinha sido vítima de hacker, e que isso ocorreu porque o sistema estava sendo testado. Alegou, ainda, que não se omitiu diante das divergências que P. vinha enfrentando com o outro aluno, tendo tomado providências para solucionar os conflitos, e que teria por fim expulsado o estudante agressor quando, certo dia, ele desferiu um soco no rosto de P. A instituição de ensino alegou, também, que teria tomado providências quando ocorreu a invasão do site da escola, requerendo informações da empresa de informática que o forneceu e pedindo a retirada imediata do texto difamatório do sistema. Afirmou, ainda, que pediu desculpas ao estudante vítima da difamação e o encaminhou à Promotoria Especializado no Combate aos Crimes Cibernéticos.
Dano à integridade
Em Primeira Instância, o pedido do estudante foi negado, por isso P. decidiu recorrer, reiterando suas alegações. Ao analisar os autos, o desembargador relator, Tibúrcio Marques, observou que “restou demonstrado que o recorrente sofreu várias agressões verbais e físicas de um colega de sala, que iam muito além de pequenos atritos entre adolescentes, no interior do estabelecimento réu, no ano de 2009, os quais caracterizam o fenômeno denominado bullying.
É certo que tais agressões, por si só, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenização seria do Colégio em razão de sua responsabilidade objetiva”. Destacando que houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do autor, o relator avaliou que a escola não conseguiu cumprir seu papel de promover a integração social de um adolescente que passou meses sofrendo agressões verbais, emocionais e por fim agressão física. “Resta evidenciado que a escola não tomou medidas para solucionar o problema, não proporcionou tratamento adequado ao caso, lesando o bem maior a ser protegido, ou seja, a dignidade do autor/adolescente”.
Quanto ao texto difamatório postado no site, o relator julgou que o colégio assumiu o ônus pela má-utilização do serviço que disponibilizou, pois o sistema não possuía ferramenta de controle verdadeiramente pronto e eficaz contra a prática de abusos e não permitiu a identificação do usuário que postou a mensagem de conteúdo ofensivo à imagem e honra do aluno.
Assim, o desembargador relator avaliou que o colégio era responsável pelos prejuízos de ordem moral causados a P., por isso deveria indenizá-lo. A indenização foi fixada em R$ 10 mil. O desembargador revisor, Tiago Pinto, discordou do relator, mas foi voto vencido, já que o desembargador José Affonso da Costa Côrtes acompanhou o redator, divergindo, apenas, no que se refere à incidência de juros.
Leia a decisão completa:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - ABALOS PSICOLÓGICOS DECORRENTES DE VIOLÊNCIA ESCOLAR - BULLYING - ESTABELECIMENTO DE ENSINO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA - DANO MORAL CONFIGURADO - REFORMA DA SENTENÇA. Na espécie, restou demonstrado que o autor sofreu agressões verbais e física de um colega de sala, que foram muito além de atritos entre adolescentes, no interior da Escola no ano de 2009. Trata-se de relação de consumo e a responsabilidade da ré, como prestadora de serviços educacionais é objetiva, bastando a simples comprovação do nexo causal e do dano. Além disso, as agressões noticiadas na inicial e comprovadas, por si, só, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenização é da Instituição de Ensino, em razão de sua responsabilidade objetiva. Muito embora o Colégio tenha tomado algumas medidas na tentativa de contornar a situação, tais providências não foram suficientes para solucionar o problema, uma vez que as agressões continuaram até a ocorrência da agressão física. O Requerido não atentou para o papel da escola como instrumento de inclusão social. A reparação moral tem função compensatória e punitiva. A primeira, compensatória, deve ser analisada sob os prismas da extensão do dano e das condições pessoais da vítima. A finalidade punitiva, por sua vez, tem caráter pedagógico e preventivo, pois visa desestimular o ofensor a reiterar a conduta ilícita. Sobre os danos morais incidirão juros de mora desde o evento danoso (Súmula nº 54 do STJ). A fixação dos honorários advocatícios nas decisões de natureza condenatória é arbitrada com base no valor da condenação, na forma do art. 20, § 3º, do CPC. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.10.142345-7/002 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): PABLO LEAL CARDOZO - APELADO(A)(S): COLÉGIO CAVALIERI LTDA
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 15ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à maioria, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O REVISOR E PARCIALMENTE O VOGAL.
RELATOR. DES. TIBÚRCIO MARQUES
V O T O
Cuida-se de recurso de apelação interposto de sentença que, nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais proposta por PABLO LEAL CARDOZO em desfavor de COLÉGIO CAVALIERI, Mantenedora São Francisco de Sales Ltda, o Juiz primevo julgou improcedente o pleito inicial por entender que não restou configurado o nexo causal entre a conduta do colégio e eventual dano moral sofrido pelo autor, além da escola não ter contribuído com alguma prática lesiva proposital ou intencional para prejudicar o requerente.
Irresignado, apela do autor, ás fls. 202/207, alegando fazer jus a indenização por danos morais em razão de agressões verbais e física sofridas por ele dentro do estabelecimento de ensino apelado. Afirma que a escola não contribuiu com algum substancial para coibir a prática lesiva proposital ou intencional para prejudicar o autor. Assevera que o ato praticado de "bullying", foi por parte do aluno "Andreiev", e que os ocorridos, eram de conhecimento da própria instituição. Aduz que, além do citado, houve veiculação de informações desabonadoras, pela internet, tratando-se de imperícia, negligência na operação do "site", por parte da escola. Defende que o depoimento das testemunhas atesta o abalo emocional e físico que sofreu no ano de 2009. Ressalta que cabe á apelada manter a incolumidade físicas e moral de seus alunos, enquanto sob sua guarda temporária, conforme determina o artigo 932 do Código Civil Brasileiro. Cita que sofreu abuso moral por causa de informações constantes no "site" da Instituição e também sofreu "bullying" dentre das repartições da apelada, o que a tornaram responsável por enquanto o aluno estiver sob sua guarda. Requer a reforma da sentença, com o provimento do recurso e a condenação da requerida em Danos Morais. Apelação recebida em ambos os efeitos, fl. 209. Contra-razões ás fls.210/215, pela manutenção da sentença. É o relatório.
ADMISSIBILIDADE
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
MÉRITO
Propõe o autor ação de danos morais alegando a prática de "bullying", onde afirma que a Instituição de Ensino criou "site" na internet com informações postadas pela coordenação da escola e no dia 08/09/2009 encontrou difamação envolvendo seu nome. Afirma que comunicou à sua mãe e, se dirigiram ao Colégio, onde foram atendidos pela secretária "Núbia", e que esperaram mais de duas horas e apenas depois de ameaçar chamar a polícia foram atendidos pela Diretora da Escola, Sra. Patrícia. Cita que sua mãe sugeriu que a Instituição de ensino contactasse a administradora do site para que fosse bloqueada a página do autor.
Defende que fez a denúncia na "Promotoria Especializada no Combate aos Crimes Cibernéticos" e que informou á escola, mas que a Sra. Patrícia não retornou a ligação tratando a questão com descaso. Aduz que isso lhe trouxe transtornos psicológicos. Ressalta que além do "Bullying Cybernético", já havia uma perseguição, há muitos meses, advinda de agressões de um colega de sala de nome "Andreiev".
Diz que procurou a direção da escola, por diversas vezes, para reclamar das agressões e nada foi feito. Fala que dia 27/05/2009, após discussão verbal com esse colega de sala, ambos foram parar na Coordenação da escola e que após retornarem á sala de aula, o colega "Andreiev" deu-lhe um soco no olho esquerdo, conforme Boletim de Ocorrência á fl. 20/24. Requereu a condenação da Instituição de Ensino em Danos Morais.
Citada, a instituição de ensino contesta alegando que o autor tinha inimizade com colega de sala sendo que tal colega foi advertido até que em 27 de maio foi transferido da referida Instituição de ensino. Assevera que cada aluno tinha um código pessoal para acessar o site da escola e que, no caso, houve retirada imediata da postagem relatada na inicial. Afirma que as notas do autor permaneceram no mesmo patamar e que preferiu não expor mais o requerente colocando mensagens de esclarecimentos.
DA RESPONSABILIDADE
A responsabilidade no âmbito civil é espécie de responsabilidade jurídica e deriva da transgressão de uma norma civil pré-existente, com a consequente imposição, ao causador do dano, do dever de indenizar: Código Civil: Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Esta responsabilidade civil pode ser, objetiva, quando baseada no risco, subjetiva, se baseada na culpa, contratual e aquiliana, ou extracontratual. A responsabilidade civil subjetiva exige a comprovação da culpa, além dos elementos caracterizadores da responsabilidade que são a conduta humana, o nexo de causalidade e o dano ou prejuízo. A responsabilidade objetiva, por outro lado, baseia-se na teoria do risco.
Segundo relatado pelo ministro Celso de Mello, em trecho da conclusão do RE 109.615/RJ: "o Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno". Aqui se constata a teoria do risco, ou seja, a parte assume o dever de evitar a lesão, logo, na sua ocorrência ela deve ser indenizada, independente da constatação da culpa. Consubstanciando com o exposto, o art. 14 do Código de Defesa Consumidor dita que a responsabilidade civil das escolas por defeito na prestação de serviço é objetiva, o que não significa dizer que a vítima estaria isenta de produzir provas no processo.
Cumpre ao autor demonstrar, como fato constitutivo do seu direito, o dano em sua saúde ou bens de sua propriedade e o nexo de causalidade entre o resultado lesivo e o serviço defeituoso. A teoria objetiva no direito do consumidor dispensa a culpa do estabelecimento de ensino, mas condiciona a sua responsabilidade a alguma falha ou a algum mau funcionamento do serviço, que o faça situar como causa objetiva da lesão suportada pelo aluno.
Cláudia Lima Marques, in Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, RT, 2003, p. 248, ensina: "A responsabilidade imposta pelo art. 14 do CDC é objetiva, independe de culpa e com base no defeito, dano e nexo causal entre o dano ao consumidor-vítima (art. 17) e o defeito do serviço prestado no mercado brasileiro. Com o CDC, a obrigação conjunta de qualidade-segurança, na terminologia de Antônio Herman Benjamin, isto é, de que não haja um defeito na prestação do serviço e conseqüente acidente de consumo danoso à segurança do consumidor-destinatário final do serviço, é verdadeiro dever imperativo de qualidade (arts. 24 e 25 do CDC), que expande para alcançar todos os que estão na cadeia de fornecimento, ex vi art. 14 do CDC, impondo a solidariedade de todos os fornecedores da cadeia, inclusive aqueles que a organizam, os servidores diretos e os indiretos (parágrafo único do art. 7º do CDC)."
No mesmo sentido, Zelmo Denari, in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto, Forense Universitária, 7.ed., p. 174/175, verbis: "A exemplo do que foi estabelecido no artigo anterior, o caput do dispositivo dispõe que a responsabilidade do fornecedor de serviços independe da extensão da culpa, acolhendo, também nesta sede, os postulados da responsabilidade objetiva. As causas excludentes de responsabilidade do prestador de serviços são as mesmas previstas na hipótese de fornecimento de bens, a saber: que tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou que a culpa é exclusiva do usuário ou de terceiro.
Reportamo-nos, por isso, aos comentários feitos ao art. 12, lembrando que também nesta sede, as eximentes do caso fortuito e da força maior atuam como excludentes de responsabilidade do prestador de serviços. E de uma forma muito mais intensa, por isso que podem se manifestar durante ou após a prestação de utilidade ou comodidade ao consumidor (v.g. um hospital pode se eximir de responsabilidade pelo fato do serviço, alegando corte no fornecimento de energia elétrica ocorrido durante ou após o ato operatório). Jamais, contudo, quando forem anteriores à prestação dos serviços."
De outro lado, é certo também, segundo a lição de Rui Stoco, que "ao receber o estudante menor, confiado ao estabelecimento de ensino da rede oficial ou da rede particular para as atividades curriculares, de recreação, aprendizado e formação escolar, a entidade de ensino é investida no dever de guarda e preservação da integridade física do aluno, com a obrigação de empregar a mais diligente vigilância, para prevenir e evitar qualquer ofensa ou dano aos seus pupilos, que possam resultar do convívio escolar". Desse modo, "responderá no plano reparatório se, durante a permanência no interior da escola o aluno sofrer violência física por inconsiderada atitude do colega, do professor ou de terceiros, ou, ainda, de qualquer atitude comissiva ou omissiva da direção do estabelecimento, se lhe sobrevierem lesões que exijam reparação e emerge daí uma ação ou omissão" (in Responsabilidade Civil e a sua interpretação jurisprudencial, 1994, p. 321).
À evidência, a responsabilidade civil da escola decorre do fato de ficar ela investida no dever de guarda e preservação da integridade física e psicológica do aluno, com a obrigação de empregar a mais diligente vigilância, para prevenir e evitar qualquer ofensa ou dano aos que ali estudam.
DO BULLYING
No caso em questão, o autor narra haver sofrido "bullying" e ter sido vítima do "cyberbullying". O bullying, objeto de recentes discussões diante da tragédia ocorrida no Realengo, (Rio de Janeiro, 7 de abril de 2011), é conceito usado para definir o desejo e a ação consciente e deliberado de maltratar outra pessoa; o termo abrange comportamentos agressivos e antissociais, principalmente no que tange à violência escolar (Cleo Fante, citado por Lélio Braga in Portal LFG). Assim, a palavra inglesa que significa usar o poder ou força para intimidar, excluir, implicar, humilhar - "Bullying" hoje é estudado nacional e internacionalmente pela psicopedagogia. Esse fenômeno é praticado no seio escolar por um ou mais alunos contra outro, causando-lhe dor, angústia e sofrimento.
Escrevendo sobre "A brincadeira que não tem graça", Diogo Dreyer consigna: "(...). Especialistas revelam que esse fenômeno, que acontece no mundo todo, pode provocar nas vítimas desde diminuição na auto-estima até o suicídio. "bullying diz respeito a atitudes agressivas, intencionais e repetidas praticadas por um ou mais alunos contra outro. Portanto, não se trata de brincadeiras ou desentendimentos eventuais.
Os estudantes que são alvos de bullying sofrem esse tipo de agressão sistematicamente", explica o médico Aramis Lopes Neto, coordenador do primeiro estudo feito no Brasil a respeito desse assunto -"Diga não ao bullying: Programa de Redução do Comportamento Agressivo entre Estudantes", realizado pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência (Abrapia). Segundo Aramis, "para os alvos de bullying, as consequências podem ser depressão, angústia, baixa autoestima, estresse, absentismo ou evasão escolar, atitudes de autoflagelação e suicídio, enquanto os autores dessa prática podem adotar comportamentos de risco, atitudes delinquentes ou criminosas e acabar tornando-se adultos violentos".
A pesquisa da Abrapia, que foi realizada com alunos de escolas de Ensino Fundamental do Rio de Janeiro, apresenta dados como o número de crianças e adolescentes que já foram vítimas de alguma modalidade de bullying, que inclui, além das condutas descritas anteriormente, discriminação, difamação e isolamento. O objetivo do estudo é ensinar e debater com professores, pais e alunos formas de evitar que essas situações aconteçam. "A pesquisa que realizamos revela que 40,5% dos 5.870 alunos entrevistados estão diretamente envolvidos nesse tipo de violência, como autores ou vítimas dele", explica Aramis.
A denominação dessa prática como bullying, talvez até por ser um termo estrangeiro, ainda causa certa polêmica entre estudiosos do assunto. Para a socióloga e vice-coordenadora do Observatório de Violências nas Escolas - Brasil, Miriam Abramovay, a prática do bullying não é o que existe no país. "O que temos aqui é a violência escolar. Se nós substituirmos a questão da violência na escola apenas pela palavra bullying, que trata apenas de intimidação, estaremos importando um termo e esvaziando uma discussão de dois anos sobre a violência nas escolas", opina a coordenadora. Mas, tenha o nome que tiver, não é difícil encontrar exemplos de casos em que esse tipo de violência tenha acarretado consequências graves no Brasil.
Em janeiro de 2003, Edimar Aparecido Freitas, de 18 anos, invadiu a escola onde havia estudado, no município de Taiúva, em São Paulo, com um revólver na mão. Ele feriu gravemente cinco alunos e, em seguida, matou-se. Obeso na infância e adolescência, ele era motivo de piada entre os colegas.
Na Bahia, em fevereiro de 2004, um adolescente de 17 anos, armado com um revólver, matou um colega e a secretária da escola de informática onde estudou. O adolescente foi preso. O delegado que investigou o caso disse que o menino sofria algumas brincadeiras que ocasionavam certo rebaixamento de sua personalidade. Vale lembrar que os episódios que terminam em homicídio ou suicídio são raros e que não são poucas as vítimas do bullying que, por medo ou vergonha, sofrem em silêncio. (...)".
Corroborando com o acima exposto, foram juntadas, na inicial, o Boletim de Ocorrência á fl. 20/24, cópia de documentos da Promotoria Estadual de Combate aos Crimes Cibernéticos, fl. 26, sendo que, neste último, a mãe do autor relata que seu filho, ora requerente, foi vítima de postagem com dados inverídicos, de cunho difamatório, no site do Colégio/requerido.
Nos documentos ás fls. 118/120, observa-se, durante o mês de maio de 2009, uma série de queixas do autor relacionadas às agressões que vinha sofrendo, no interior do colégio, por parte do colega de sala, "Andreiev". Assim consta á fl. 120, documento juntado pela requerida denominado "Ficha de Entrevista" referente ao aluno Andreiev Gomes Bueno, datado de 27/05/2009: "Na manhã do dia 27/0509 recebi o aluno acima citado encaminhado pela professora Marisa/geografia por estar provocando com brincadeiras inadequadas para a sala de aula um colega, resultando em briga. Andreiev já foi advertido várias vezes pelo comportamento inadequado no colégio não havendo melhoria esperada por parte do aluno. Fica o aluno Andreiev Gomes suspenso das aulas a partir das dez horas do dia 27/05/09 e no dia 28/05/09 retornando na sexta-feira dia 29/05/09 acompanhado da mãe (...)"
As agressões foram tantas que culminaram na agressão física noticiada, ocorrida no dia 27/05/2009, conforme BO fl. 20/24, dentro da sala de aula e confissão da própria requerida á fl.95. A testemunhal ouvida á fl. 158, Jaqueline Maria Pitta de Andrade confessou: "que trabalhou no Colégio Cavallieri, ora demandado, no período do ano de 2006 à 2009;o autor sofria ataques psicológicos, afrontamentos, que vieram a culminar com ataques físicos; que as agressões aumentaram no ano de 2009, quando começaram os ataques físicos (...) Já á fl. 187, a testemunha Erlânia Rosane Sabino, afirmou: "(...) que o autor chegava em casa muito oprimido; que a depoente perguntava o que aconteceu; que o autor não falava nada e se trancava no quarto; que não conheceu os colegas de sala do autor; que o autor falou para Ires que ficavam pondo apelido nele; que uma vez a depoente viu que o autor chegou com um chute na perna; que uma vê viu que o rosto do autor estava preto por conta de uma agressão; (...)"
Além disso, muito embora a conclusão do Juiz a quo, conforme fl. 198, foi a de que "(...) depois de várias advertências a este último aluno acabou por ser expulso da escola(...)", o aluno agressor "Andreiev" não foi expulso da Escola.
O documento de fl. 121, trata-se de uma "Declaração de Transferência", datado de 01 de junho de 2009, onde assim consta: "Declaramos para os devidos fins que, Andreiev Gomes Bueno, natural de Cambridge, Massachusetts, Estados Unidos da América, nascido no dia 08 de abril de 1992, filho de Raimundo Martins Bueno e de Marlene Mendes Gomes, requereu nesta data sua transferência e seu Histórico Escolar será entregue dentro do prazo legal de trinta dias." (grifo nosso)
Da mesma forma, á fl. 95 da contestação da requerida a Instituição de Ensino confessa: "Depois do ocorrido, a Ré procurou a mãe do aluno Andreiev e, após longa conversa, ficou acertado que o mesmo seria transferido de escola." Constata-se, portanto, que não houve expulsão e sim, o aluno "Andreiev" é que requereu sua transferência para outra escola. Nesse contexto, cumpre assentar que, na espécie, restou demonstrado que o recorrente sofreu agressões verbais e física de um colega de sala que iam muito além de pequenos atritos entre adolescentes, no interior do estabelecimento réu, no ano de 2009, os quais caracterizam o fenômeno denominado "bullying", ou seja, violência escolar, de funestas conseqüências.
É certo que tais agressões, por si só, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenização seria do Colégio em razão de sua responsabilidade objetiva. Conclui-se portanto que houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do autor. No dizer de Helder Baruffi1, "Neste processo de socialização ou de inserção do indivíduo na sociedade, a educação tem papel estratégico, principalmente na construção da cidadania." (...)
A educação se apresenta como um interesse não apenas do sujeito individualmente considerado, mas como um direito coletivo, próprio da sociedade. Entretanto, o primado é o interesse superior daqueles diminuídos na sua capacidade de 'ser gente', como expressa Paulo Freire. Não há como pensar este direito sem referirmo-nos ao sujeito próprio da educação que deve ser apreendido no seu sentido de construtor da realidade.
O direito à educação e o direito de aprender são direitos de todos e de cada uma das crianças e adolescentes. Mas não uma educação qualquer. É um direito de 'toda pessoa', sem qualquer tipo de discriminação, independente de origem étnica, racial, social ou geográfica.(...)."
Assim, a escola e a família são consideradas as instituições pilares da sociedade. É no ambiente escolar que crianças e adolescentes aprendem as noções de convívio e agregam conhecimento para formar o caráter. De outro turno, na família são construídos os primeiros conceitos de moralidade, civismo e ética. Família e escola são responsáveis pela formação do cidadão.
Vale lembrar que o art. 227 da Constituição Federal dispõe ser dever da família, da sociedade e do Estado o dever de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à educação, dentre outros. E o direito à educação, como direito subjetivo público, é um direito social fundamental, art. 6º c/c art. 205 CF, com três objetivos definidos na Constituição Federal, que estão diretamente relacionados com os fundamentos do Estado brasileiro, art. 1º c/c art. 3º da CF: pleno desenvolvimento da pessoa, preparo da pessoa para o exercício da cidadania e qualificação da pessoa para o trabalho.
E a Escola apelada não conseguiu cumprir o seu papel de promover a integração social de um adolescente que passou meses sofrendo agressões verbais, emocionais e por fim agressão física. Ao que parece, as estratégias pedagógicas aplicadas não surtiram efeito na relação entre os adolescentes da sala do autor.
Nesse sentido, resta evidenciado que a escola não tomou medidas para solucionar o problema, não proporcionou tratamento adequado ao caso, lesando o bem maior a ser protegido, ou seja a dignidade do autor/adolescente. Sobre a dignidade humana ensina-nos Alexandre de Moraes, In Direito Constitucional, 18 ed., São Paulo: Atlas, 2005. p.16.: "A dignidade humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito pelas demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direito fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos."
DO NEXO CAUSAL
Quanto ao nexo causal entre a conduta do responsável pelo serviço e o dano sofrido pelo aluno, não será exigida em juízo ao representante do aluno nenhuma prova mais elaborada sobre o ocorrido. O ônus da prova é do estabelecimento de ensino e à vítima só caberá a prova de verossimilhança, decorrente das regras da experiência comum, que permita um juízo de probabilidade. O contrato de prestação de serviço educacional é, em regra, por adesão, e não pode conter cláusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a obrigação de indenizar do fornecedor.
A educação é um direito social e deverá ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. No dizer de Helder Baruffi, "Neste processo de socialização ou de inserção do indivíduo na sociedade, a educação tem papel estratégico, principalmente na construção da cidadania."
O adolescente foi agredido quando se encontrava no interior da escola e sob a guarda e vigilância do estabelecimento de ensino. Segundo Agatha Gonçalves Santana, "De acordo com o estudo da ONG Plan, 58% das escolas não acionam os pais das vítimas nem dos agressores; 80% delas não punem os autores do Bullying." E completa "Pior ainda é quando, na prática, a escola que possui serviço de acompanhamento psicológico, apenas foca para o agredido, fazendo com que o agressor, impune, fique do lado de fora apenas rindo e continuando seguro de suas ameaças e ridicularizações."
Com efeito, dos fatos narrados nestes autos, verifico a ocorrência do dano, e do nexo causal entre a atitude da escola e o dano sofrido pelo adolescente. Vale lembrar ser desnecessária a comprovação de culpa, ante a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor.
Neste sentido, encontramos nos Tribunais de Justiça do Rio de Janeiro e do Distrito Federal decisões condenando escolas a indenizar as vítimas de bullying: No Acórdão de número 317.276, julgado em 9 de julho de 2008, pela 2ª Turma Cível do TJ-DF, o relator Waldir Leôncio Lopes Júnior, concluiu haver responsabilidade objetiva da escola, diante da ocorrência de danos morais por abalos psicológicos decorrentes de violência escolar. Em suas palavras: "é certo que tais agressões, por si só, configuram dano moral cuja responsabilidade de indenização seria do colégio em razão de sua responsabilidade objetiva".
No julgamento proferido pelo tribunal carioca, Apelação 0003372-37.2005.8.19.0208, julgado em 2 de fevereiro de 2011, pela 13ª Câmara Cível e relatada pelo desembargador Ademir Pimentel, a conclusão foi a mesma: havendo falha na prestação de serviço por estabelecimento de ensino, a responsabilidade é objetiva diante do reconhecimento de dano moral advindo da prática de bullying. Neste julgamento em específico, o estabelecimento educacional era prestador de serviço, incidindo na espécie normas do Código de Defesa do Consumidor ("Trata-se de relação de consumo e a responsabilidade da ré, como prestadora de serviços educacionais é objetiva, bastando a simples comprovação do nexo causal e do dano").
Na apelação nº 20060310083312, julgamento de 09/07/2008, DJU de 25/08/2008, p. 70, o eminente Desembargador WALDIR LEÔNCIO JÚNIOR, Segunda Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, assim se pronunciou: "DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. ABALOS PSICOLÓGICOS DECORRENTES DE VIOLÊNCIA ESCOLAR. BULLYING. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA. SENTENÇA REFORMADA. CONDENAÇÃO DO COLÉGIO. VALOR MÓDICO ATENDENDO-SE ÀS PECULIARIDADES DO CASO.(...)" O desembargador Ademir Paulo Pimentel, relator do processo 0003372-37.2005.8.19.0208, afirmou que "os fatos relatados e provados fogem da normalidade e não podem ser tratados como simples desentendimentos entre alunos".
Estando configurado o dano moral e a responsabilidade da escola, que detém o dever de manutenção da integridade física e psíquica de seus alunos, a 13ª Câmara Cível, por unanimidade de votos, acordou em negar os recursos, o agravo retido e a apelação." Entendo, assim, haver restado comprovado os danos morais experimentados pelo autor no caso vertente.
DO CYBERBULLYING
Por fim, o autor alega que a requerida criou um site na internet , onde cada aluno recebe sua respectiva senha para fins de atos administrativos e que em 08.09.09 constou uma advertência, constando texto difamatório com o nome do autor, conforme fl. 25, sendo postada por professor que não trabalhava mais na escola. Trata-se de "cyberbullying", um tipo de "bullying" que se concretiza pela utilização de tecnologias de comunicação, como computadores e celulares ligados à Internet, para realização dessas violências, se assemelham com as outras modalidades e seus efeitos podem ser irrecuperáveis e perdurar por toda a vida da vítima.
Muito embora, a requerida alegue que o referido site estava disponível há apenas quatro dias, fl. 96 e que foi a empresa "Consulte Informática", contratada para a implantação do site, não se dispondo a apelada a desenvolver uma ferramenta de controle verdadeiramente pronto e eficaz contra a prática de abusos, tampouco procedendo à identificação precisa do usuário que posta mensagem de conteúdo claro e patentemente ofensivo à honra e imagem de outrem, entendo que ela assume, integralmente, o ônus pela má-utilização dos serviços que disponibiliza. Portanto, considero que a Instituição de Ensino é responsável pelos prejuízos de ordem moral causados ao requerente, também em decorrência da infausta postagem de perfil difamatório.
DO QUANTUM
O montante de reparação deve ser razoavelmente expressivo para satisfazer, ou compensar, o dano e a injustiça que a vítima sofreu, proporcionando-lhe uma vantagem, com a qual poderá atenuar parcialmente seu sofrimento. Não obstante, a condenação tem, também, um componente punitivo e pedagógico, refletindo no patrimônio do ofensor, como um fator de desestímulo à prática de novas ofensas. No entanto, é imprescindível que se faça um juízo de valoração da gravidade do dano, da culpa e da situação econômica - financeira das partes, dentro das circunstâncias do caso concreto, de modo que não se arbitre uma indenização exorbitante, nem insignificante, mas dentro de limites razoáveis, jamais podendo converte-se em fonte de enriquecimento sem causa.
Examinando a questão, o insigne professor Caio Mário da Silva Pereira proclama: "Na determinação do prejuízo de afeição cumpre ter em vista o limite do razoável, a fim de que não se enverede pelo rumo das pretensões absurdas", haja vista que "na ausência de um padrão ou uma contraprestação que dê o correspectivo da mágoa, o que prevalece é o critério de atribuir ao juiz o arbitramento de uma indenização." (Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, Forense, p. 317/318).
A Ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, sugere os seguintes critérios: "O grau de culpa do ofensor, suas condições econômicas, as conseqüências e circunstâncias do evento danoso, o comportamento, idade e sexo da vítima, a gravidade da lesão, localização das seqüelas, a permanência do sofrimento e, sobretudo, seus reflexos na readaptação do acidentado na vida social" (REsp 318.379/MG, Rel. Min. Fátima Nancy, in DJ 04-02-2002).
Do Ministro Sálvio de Figueiredo, colhe-se a seguinte lição: "A indenização, como se tem registrado em diversas oportunidades, deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que venha a constituir-se em enriquecimento indevido, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve procurar desestimular o ofensor a repetir o ato" (REsp 245.727/SE, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, in DJ 05/06/2000).
Assim, o quantum indenizatório deve ser fixado de acordo com as circunstâncias específicas do evento danoso, com a condição econômico-financeira das partes e à gravidade da ofensa, sempre em sintonia com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de maneira que seja atendido o caráter compensatório, pedagógico e punitivo da condenação, sem gerar enriquecimento indevido do lesado, nem constituir incentivo à prática perpetrada pelo ofensor.
No caso dos autos, restou demonstrado o sofrimento experimentado pelo autor. Por outro lado, deve-se levar em conta a capacidade financeira do Colégio/apelado. Sem perder de vista todos os aspectos ponderados ao longo deste voto, acredito ser complexa a tarefa de fixação do valor devido a título de danos morais; sopesando as peculiaridades do caso e os valores que vêm sendo arbitrados pela jurisprudência, fixo o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, com incidência de juros de mora desde o evento danoso, conforme Súmula n.º 54 do STJ, e correção monetária desde a publicação deste acórdão. In casu, estimo a aludida quantia razoável considerando as agressões sofridas pelo autor e a capacidade financeira da ofensora.
Tal montante é justo para que não se converta em locupletamento para o recorrente, nem permita que ele se torne inócuo para a empresa recorrida, enfatizando, assim, o caráter pedagógico da penalização. É que deve ser evitado o valor excessivo ou ínfimo, visando, sempre o desestímulo à conduta lesiva.
DISPOSITIVO
Com tais considerações, DOU PROVIMENTO AO RECURSO, para condenar a apelada ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais ao autor, incidindo juros de mora desde o evento danoso e correção monetária desde a publicação do acórdão. Tendo em vista a presente decisão, com fundamento no art. 20, § 3º do CPC arbitra-se os honorários advocatícios em 10% sob o valor da condenação. Condena-se a apelada ao pagamento dos honorários advocatícios e das custas processuais, inclusive as recursais. DES. TIAGO PINTO (REVISOR)
V O T O
Divirjo do em. Relator. Pablo Leal Cardozo ajuizou ação de indenização por danos morais contra Colégio Cavalieri Mantenedora São Francisco de Sales Ltda. sob o fundamento de ter sofrido bullying enquanto estudava na instituição de ensino. O fato que ensejou a propositura da ação foi a veiculação de "advertência" de cunho difamatório no sítio eletrônico da ré. Tanto é assim, que o autor/apelante, após narrar detidamente às fls. 02/05 o ocorrido após a visualização da referida advertência, afirma que "após tal episódio, o comportamento do Autor mudou completamente, o nível de estresse foi tão grande que endureceu os ombros de uma certa maneira que a sua postura estava totalmente descontrolada, andava 'torto', ficou muito angustiado, com medo de sair de casa, chegou ao ponto de não querer ir mais para a escola, sentiu totalmente menosprezado pelos coordenadores e pela direção, e os pais deste, sem opção devido as condições financeiras, tiveram que mantê-lo na escola, mesmo porque, na referida escola o Autor tinha o seu outro irmão." (fl. 06). O autor aponta como episódio causador da lesão ao seu patrimônio imaterial, a postagem da "advertência" que transcreveu às fls. 03, e não outro fato. As asserções sobre a existência de "uma perseguição, advinda de atos vexatórios e agressões de um colega de sala, (...)" (fl. 07), com agressão física na data de 27/05/2009, são fatos autônomos, no tempo e no espaço, em relação ao fato que fundamenta o único, diga-se, pedido indenizatório.
O conflito existente entre o autor e o aluno que o agrediu contextualiza a situação por ele vivenciada, mas não é o fato essencial em que funda o pedido. É mesmo a teoria da substanciação da causa de pedir, para qual importa a descrição "do contexto fático em que as partes as partes se encontram envolvidas." (in Código de processo civil comentado artigo por artigo/ Luiz Guilherme Marinoni, Daniel Mitidiero. - 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunas,. 2011, p. 292). O autor não fez decorrer da situação vivenciada com aluno específico, incluindo a agressão física, pedido autônomo de indenização. Não há cúmulo de pedidos. Não há, repita-se, desse fato alegado, pedido de condenação independente. Ainda que assim fosse, o que se extrai dos autos é a existência de conflito pessoal entre o autor/apelante e o então colega de classe Andreiev, sendo que as agressões verbais eram mútuas e a agressão física, consistente em "'soco' no olho esquerdo" (fl. 07), decorreu deste contexto conflituoso, não ensejando à condenação da escola, que advertiu os alunos e aplicou penalidades no âmbito de seu poder de direção, ao pagamento de indenização por dano moral.
Consta no depoimento da testemunha Ana Carolina Silva Matozinhos, que estudava com o autor: "que houve agressão contra o autor; que quem agrediu foi outro colega de sala chamado Andreiev; que não houve outras pessoas que agrediu o autor; que houve agressão física; que quanto à agressão verbal era dos dois lados; (...) que antes quando havia discussões verbais entre os dois a escola chamava para conversar, que havia brincadeiras de mal gosto dos dois lados e a professora encaminhava para a coordenação; que a coisa era mais entre os dois não envolvendo outros alunos. (...)" (fl. 189).
O fato que deve ser analisado para eventual condenação da ré/apelada ao pagamento de indenização por dano moral é a publicação de "advertência" com conteúdo difamatório em seu site, vez que é este o fato essencial que integra a causa de pedir. Só há obrigação de indenizar quando há dano. No caso dos autos, o autor indica como efeitos do dano moral que alega ter sofrido a mudança de comportamento, aumento do estresse, angústia, medo de sair de casa e vontade de não ir à escola. Contudo, os elementos trazidos aos autos não comprovam tal alegação. Há elementos objetivos que demonstram que o desempenho escolar do autor/apelante se manteve satisfatório, conforme cotejo entre as notas no 1º, 2º e 3º trimestre (fls. 131), continuou a freqüentar a escola e foi aprovado em dois vestibulares de universidades federais, conforme narrado na própria inicial (fl. 07).
Consta dos autos que a mensagem de cunho difamatório não foi disponibilizada na parte do site que é de amplo acesso do público. Na verdade, a postagem ocorreu na parte que contém dados individuais, cujo acesso é restrito ao próprio aluno e aos seus pais ou responsáveis, por meio de usuário e senha de uso pessoal e intransferível. A mensagem, disponibilizada sob o alcunho de "advertência", segundo consta dos autos, só foi visualizada pelo autor, seus familiares e alguns funcionários da escola no momento em que foi comunicada do ocorrido. Não há qualquer indício de que os demais alunos tiveram acesso à postagem, fato corroborado pelo depoimento da testemunha Ana Carolina Silva Matozinhos, que estudava com o autor: "que não ficou sabendo de alguma publicação na internet contra o autor" (fl. 189).
Ao ser comunicada, a escola ré imediatamente contatou a empresa responsável pelo site e a postagem foi retirada de imediato. Além da ocorrência em nome do autor, foi retirada a parte do site que contém dados individuais de todos os alunos, conforme requerimento da própria ré/apelada.
Segundo informou a empresa responsável pelo site, "o responsável pela postagem utilizou uma senha de acesso de usuário administrador do sistema, que foi obtida por acesso de 'Hackers'" (fls. 129), o que indica que a instituição de ensino não pode ser responsabilizada pelo conteúdo difamatório do texto.
Os autos comprovam a manutenção do rendimento escolar do autor. A postagem não foi amplamente divulgada, mas sim disponibilizada em área do site da escola de acesso restrito ao próprio aluno e pais ou responsáveis. Logo que foi comunicada pelo autor e sua genitora sobre a mensagem difamatória a ré/apelada procedeu à retirada do conteúdo, cuja postagem não lhe pode ser imputada, pois decorreu de acesso de "hackers" ao seu site.
Apesar do dissabor experimentado, os elementos dos autos não indicam que o autor sofreu abalo psicológico a ensejar a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano moral em razão da disponibilização da mensagem de cunho difamatório na parte de acesso restrito e não divulgada de seu sítio eletrônico. Por esses fundamentos, com a devida vênia ao em. Relator, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a sentença. Custas recursais, pelo apelante, suspensa a exigibilidade em razão da assistência judiciária deferida. DES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTESDES. JOSÉ AFFONSO DA COSTA CÔRTES (VOGAL)
V O T O
Estou de acordo com o voto do em. Des. Relator, porém apresento divergência tão somente no que concerne à incidência de juros, devendo essa também ser contada desde a publicação do acórdão.
SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O REVISOR E PARCIALMENTE O VOGAL"
1 In "Direitos Fundamentais e cidadania", coordenação Zulmar Fachin, Editora Método, São Paulo, 2008, p. 84.
Fonte:
Assessoria de Comunicação Institucional - Ascom TJMG - Unidade Raja Gabaglia
Tel.: (31) 3299-4622 - ascom.raja@tjmg.jus.br
Processo nº 1.0024.10.142345-7/002

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